EFEITOS
DE RELAÇÕES CaSO4 /CaCO3 NA MOBILIDADE DE NUTRIENTES NO
SOLO E NO CRESCIMENTO DO ALGODOEIRO (1)
A.A. SILVA (2);
F. R. VALE (3);
L. A. FERNANDES (4);
A.E. FURLANI NETO (5);
J. A. MUNIZ (6)
RESUMO
O experimento, realizado
em casa de vegetação no Departamento de Ciência do Solo da Universidade Federal
de Lavras, teve por objetivo estudar o efeito de diferentes relações de CaSO4/CaCO3
, que simulam o uso de gesso e calcário, na movimentação de nutrientes no
solo e no crescimento do algodoeiro, cultivar IAC-20. As proporções de CaSO4/CaCO3
utilizadas foram: 0/100, 25/75, 50/50, 75/25 e 100/0, com base em peso
equivalente, além de um tratamento testemunha, sem aplicação de CaSO4 e
CaCO3.Observou-se acentuada movimentação de cálcio e de sulfato em
profundidade, como íons acompanhantes, com o aumento da relação CaSO4/CaCO3
. Para o N-NO3 e Mg+2 ao contrário do N-NH4 e
K+, observou-se um acúmulo em profundidade, com a elevação da
relação CaSO4/CaCO3. Neste estudo, o gesso teve pouco ou
nenhum efeito sobre a acidez e Al trocável presentes nas camadas
subsuperficiais. A produção de matéria seca do algodoeiro foi reduzida com o
aumento da relação CaSO4/CaCO3, porém, quando comparada à
do tratamento testemunha, a aplicação de gesso aumentou-a significativamente,
atestando o potencial de uso do gesso agrícola.
Termos para
indexação: calagem, gessagem, algodoeiro.
SUMMARY: EFFECTS 0F CaSO4/CaCO3 RATIOS ON
THE MOVEMENT 0F NUTRIENTS IN SOIL AND COTTON GROWTH
The experiment was carried out in greenhouse at the Soil Science
Department - Federal University of Lavras, Minas Gerais,
Index terms: Liming, gypsum, cotton.
INTRODUÇÃO
Os solos das
áreas de cerrado, em sua maioria, são superficialmente ácidos, condição
totalmente adversa para o cultivo do algodoeiro, planta bastante sensível à
acidez do solo. As limitações desses solos, todavia, vão além da camada arável,
atingindo as camadas subsuperficiais, onde a toxidez do alumínio e a baixa
disponibilidade de cálcio são os principais fatores que impedem a maximização
das produções, por limitar o desenvolvimento radicular e consequentemente, a
utilização de água e de nutrientes em profundidade. Dessa forma, práticas que
visem à neutralização do alumínio tóxico e à elevação dos teores de cálcio são
essenciais para o cultivo do algodoeiro em tais condições.
Existem
alternativas à calagem para promover maior aprofundamento do sistema radicular,
principalmente práticas envolvendo alterações das propriedades químicas do
subsolo e o cultivo de variedades tolerantes. Em condição de campo, tem-se
observado uma boa eficiência do sulfato de cálcio em promover a movimentação do
cálcio para as camadas subsuperficiais (Farina & Channon, 1988).
O efeito da
neutralização e a conseqüente redução na atividade do Al3+ na
solução do solo com o uso de gesso ainda são objeto de estudo. Os mecanismos
propostos incluem o deslocamento do alumínio pelo cálcio e, consequentemente,
lixiviação do alumínio solúvel. Segundo Oates & Caldwell (1985), a forma
AlSO4 é de lixiviação mais fácil do que as demais formas de
alumínio. Outro mecanismo seria a redução da atividade do alumínio pela
formação de pares iônicos com o íon sulfato e aumento da concentração de cálcio
(Summer et al., 1986).
A redução na
saturação de alumínio, quando se usa gesso, é apenas uma diluição com cálcio,
pois a formação do par iônico AlSO4 não deve ser considerada uma
reação de neutralização, por se tratar apenas de uma associação de ions que
acontece na solução, com cancelamento mútuo de cargas, mas sem transferência de
prótons (Raij, 1988). Apesar de ser essa associação benéfica ao desenvolvimento
radicular, o complexo AlSO4+ formado é de baixa
estabilidade e se desfaz por diluição da solução, deixando Al3+ livre
novamente para ser absorvido pelas raízes. Possivelmente, essa dissociação
ocorre distante da zona das raízes, uma vez que o AlSO4 + é
mais lixiviado do que o alumínio livre (Oates & Caldwell, 1985),
evidenciando que o mecanismo básico de ação do gesso em reduzir a fitotoxidez
do alumínio não está bem elucidado.
Além da
movimentação descendente de cálcio, a aplicação de gesso pode ocasionar
lixiviação de potássio e magnésio nas formas de K2SO40
e MgSO40 (Pavan et al., 1984), indicando que a gessagem
em substituição à prática ria calagem, visando minimizar os efeitos da acidez
do solo, pode não ser a recomendada. Por outro lado, não há dúvidas do
potencial de uso do gesso na melhoria das propriedades químicas das camadas
subsuperficiais dos solos sob cerrado, devido principalmente ao baixo teor de
cálcio da maioria desses solos.
Quando se avalia
o potencial de uso do gesso agrícola, há necessidade de comparar doses e
proporções gesso/calcário para as diferentes relações solo-planta, considerando
as várias causas de deficiente crescimento das raízes em subsolos ácidos e o
comportamento diferencial das plantas quanto à acidez. O presente trabalho
objetivou avaliar a movimentação de nutrientes no solo, bem como a produção de
matéria seca do algodoeiro, quando da aplicação de diferentes relações CaSO4/CaCO3.
MATERIAL E
MÉTODOS
O presente estudo
foi realizaria cem casa de vegetação do Departamento de Ciência do Solo da
Universidade Federal de Lavras, utilizando um Latossolo Vermelho-Amarelo (LVd)
textura argilosa fase cerrado, sob vegetação natural, escolhido pelo baixo teor
de cálcio, notadamente na superfície (Quadro 1).
O material de
solo foi coletado nas camadas de 0-20, 20-40 e 40-60 cm de profundidade. Após
secagem ao ar, o material de solo foi passado em peneira de 5 mm e
acondicionado em colunas de PVC com 20 cm de diâmetro, constituídas de três
anéis de 20 cm de comprimento. A seqüência do solo nas colunas seguiu a
disposição natural no campo, isto é, a camada de 0-20cm ocupou o anel superior;
a de 20-40 cm, o anel central, e a de 40-60 cm, o anel inferior.
A necessidade de
calcário, para estabelecimento do referencial com 100% de CaCO3, foi
determinada, visando à elevação da saturação por bases para 70%. A partir da
dose total de calcário recomendada, estabeleceram-se diferentes proporções de
CaSO4/CaCO3, pela aplicação de CaSO4.2H2O
em substituição a 0, 25, 50, 75 e 100% do CaCO3, com base em peso
equivalente. Um sexto tratamento, representando a testemunha, refere-se à não aplicação
de CaCO3 e CaSO4.2H2O.
Os tratamentos
foram formulados com a utilização de CaCO3 e CaSO4.2H2O
p.a. misturados a 6 kg de solo, correspondentes à camada de 0-20 cm. Após essa
aplicação, toda a coluna de material de solo passou por um período de incubação
de 30 dias, com manutenção da umidade em torno da capacidade de campo.
Terminado o período de incubação, efetuou-se uma lavagem do solo por meio de
gotejamento lento com quatro litros de água aplicados durante seis horas,
usando dispositivo de suprimento de soro, até coletar 200 ml de solução na base
da coluna. A coleta de água percolada encerrou-se doze horas após o início da
sua aplicação. Com esse procedimento, antes do plantio, procurou-se simular uma
condição de movimentação do gesso no campo que necessita de significativa
infiltração de água no perfil do solo. Ressalte-se que a condição de percolação
da água entre as colunas foi bastante homogênea, considerando-se o volume gasto
para coletar os 200 ml de água percolada por coluna. Foi efetuada uma adubação
básica na camada de 0-10 cm, dez dias antes do plantio, aplicando-se (mg kg-1):
50 de N; 125 de P; 125 de K; 33 de S e 93 de Mg, utilizando-se as fontes CO(NH2)2;KH2PO4;
MgSO4.7H2O; Mg(NO3) 2. Foi
aplicada, também, uma solução de micronutrientes, suprindo cada coluna com 720
mg de ZnSO4, 290 mg H3BO3, 360 mg MnCl2,
180 mg CuCl2, 20 mg H2MoO4 e 0,5 mg de FeEDTA.
Quadro 1.
Principais características (1) químicas e físicas do LVd, em diferentes
profundidades, antes dos tratamentos com CaSO4 e CaCO3
Característica |
Profundidade (cm) |
||
0-20 |
20-40 |
40-60 |
|
pH (H2O - 1:2,5) |
5,2 |
5,2 |
5,3 |
P, mg/dm3, Mehlich-1 |
1 |
1 |
1 |
K, mg/dm3, Mehlich-1 |
32 |
16 |
10 |
Ca 2+ , mmolc /dm3 , KCl 1 mol L-1 |
5 |
3 |
2 |
Mg 2+ , mmolc /dm3 , KCl 1 mol L-1 |
1 |
1 |
1 |
Al 3+ , mmolc /dm3 , KCl 1 mol L-1 |
6 |
4 |
1 |
H + Al , mmolc /dm3 |
36 |
27 |
21 |
S , mmolc /dm3 |
7 |
4 |
3 |
CTC , mmolc /dm3 |
13 |
8 |
4 |
T , mmolc /dm3 |
43 |
31 |
24 |
m% |
46 |
50 |
25 |
V% |
16 |
13 |
12 |
Areia, g. kg-1 |
320 |
300 |
280 |
Silte, g. kg-1 |
230 |
230 |
410 |
Argila, g. kg-1 |
450 |
430 |
310 |
(1)- Análises realizadas no departamento de Solo da Universidade Federal de Lavras. |
O cultivar de algodoeiro
utilizado foi o IAC-20, semeando-se sete sementes por coluna. Antes da primeira
adubação em cobertura, foi feito o desbaste, deixando-se uma planta por coluna.
A adubação em cobertura, em três parcelamentos, foi efetuada em intervalos de
quinze dias após o plantio, sendo as duas primeiras com 50 mg kg-1
de N, na forma de uréia, e 37 mg kg-1 de K, na forma de KH2PO4,
e a terceira com apenas 50 mg kg-1 de N, também na forma de uréia.
Após cada adubação em cobertura efetuou-se nova lavagem do solo com água
destilada, até coletar cerca de 200 ml de solução na base da coluna. Nesse
caso, a quantidade de água aplicada variou entre os tratamentos. Durante o
experimento, as colunas foram periodicamente pesadas, repondo-se com água
destilada o volume de água evapotranspirada, mantendo aproximadamente 60% do
volume total de poros ocupados com água.
O algodoeiro foi
colhido aos 90 dias do plantio, sendo determinada a produção de matéria seca da
parte aérea. As colunas foram septadas a cada 10cm sendo as raízes coletadas,
lavadas e secas para determinação da matéria seca e do comprimento das raízes
de acordo com o método de Newman (1966), obtido por meio da pesagem do sistema
radicular de cada planta e medição e pesagem de uma amostra representativa do
sistema radicular.
Nas amostras de
solo, coletadas a cada 10 cm da coluna, determinaram-se o pH em água, os teores
de nitrato e amônio pelo método semimicro Kjeldahl (Bremner & Edwards,
1965), Ca, Mg e Al trocáveis (Vettori, 1969), P e K extraídos com Mehlich-1 e analisados,
respectivamente, por colorimetria e fotometria de chama (Vettori, 1969), e S-SO42-
por turbidimetria (Blanchar et al., 1965).
O delineamento
experimental utilizado foi o de blocos casualizados, com seis tratamentos
(relações percentuais de CaSO4/CaCO3 de 0/0, 100/0,
75/25, 50/50, 25/75 e 0/100, com base em peso equivalente) e quatro repetições.
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
O aumento do teor
do cálcio trocável em profundidade, principalmente nas camadas de 20-30 e 30-40
cm, revelou movimentação de cálcio (Quadro 2).Tal aumento implicou na redução
do teor de cálcio trocável nas camadas de 0-10 e 10-20 cm, com a elevação da
proporção CaSO4/CaCO3 (Quadro 2). O enriquecimento das
camadas subsuperficiais com o cálcio, quando da adição de sulfato de cálcio no
solo, também foi observado por Pavan et al. (1984) e Dias et al. (1994).
Ressalte-se, entretanto, que o enriquecimento das camadas subsuperficiais com
cálcio depende também da quantidade de CaCO3 aplicada (Dalbó et al.,
1986).
Comparando com a
testemunha, percebe-se que a total substituição do CaCO3, pelo CaSO4
promoveu o enriquecimento das camadas subsuperficiais em cálcio da ordem
de 9,3 mmolc dm-3 , para a camada de 20-30 cm; de 6,6
mmolc dm-3 , para a camada de 30-40 cm, de 2,1 mmolc
dm-3, para a camada de 40-50 cm, e de 0,5 mmolc dm-3
, para a camada de 50-60 cm. Tal enriquecimento é bastante expressivo, se for
considerada a baixa CTC efetiva, bem como a elevada saturação em alumínio do
solo utilizado, embora, nas camadas de 40-50 e 50-60 cm, os teores de cálcio
não tenham diferido significativamente entre os tratamentos testados (Quadro
2). A movimentação de cálcio em profundidade, quando aplicado na forma de
carbonato, pode estar relacionada com a utilização de CaCO3, puro
micropulverizado, favorecendo o maior arraste pela água percolada de partículas
não dissociadas.
Com relação ao
magnésio trocável (Quadro 2), apesar de não ter sido observada variação
significativa do seu teor, em função do uso de diferentes relações CaSO4/
CaCO3, nota-se que, quanto maior a quantidade de CaSO4 aplicada,
maior foi a tendência de movimentação do magnésio em profundidade. Tal fato
pode ser constatado pelo aumento no teor de magnésio na camada de 30-40 cm
(Quadro 2) de cerca de duas vezes, quando da aplicação de 100% de CaSO4.2H2O
em comparação com 100% de CaCO3, ou com a testemunha. Esse aumento é
bastante expressivo em termos agronômicos. De qualquer forma, a lixiviação de
magnésio seguiu a mesma tendência observada por Pavan et al. (1984); Dalbó et
al. (1986); Farina & Channon (1988) e Dias et al. (1994).
Para o potássio
(Quadro 2), não foi observada movimentação em profundidade, corroborando os
resultados de Farina & Channon (1988), mas em desacordo com os de Pavan et
al. (1984) e Dalbó et al. (1986). A ausência de lixiviação de potássio, nesse
estudo pode ser atribuída à prática da adubação potássica em cobertura,
inclusive feita de forma parcelada. Assim sendo, tal manejo para a adubação
potássica, associado à prática da calagem, pode ser útil para minimizar a perda
de potássio, com potencial de ocorrência quando se utiliza o gesso no campo.
Com o aumento na
quantidade de CaSO4, observou-se expressivo aumento no teor de S-SO42-no
solo, até à camada de 30-40 cm (Quadro 2). A movimentação de sulfato em
profundidade parece ter ocorrido predominantemente como ânion acompanhante do
cálcio. Entretanto, ressalta-se que, na camada de 40-50 cm, ao contrário do
cálcio não houve aumento no teor de sulfato (Quadro 2), indicando que o sulfato
não deve ter sido o único ânion acompanhante do cálcio, em seu movimento
descendente.
A divergência
entre os padrões de acumulação de cálcio e enxofre quando da aplicação de gesso
no cultivo do milho no campo fez com que Farina & Channon (1988)
propusessem certo papel para o nitrato como íon acompanhante do cálcio, no seu
movimento descendente no perfil do solo.
Com relação ao
N-NH4+ não se observou efeito dos tratamentos sobre sua
movimentação no solo (Quadro 3). Por outro lado, notou-se acúmulo de amônio em
profundidade para a testemunha. Possivelmente, tal acúmulo se deveu à redução
da taxa de nitrificação, decorrente da acidez do solo e do menor consumo pelas
plantas sob tal condição.
Quadro 2. Teores
de cálcio, magnésio, potássio e enxofre nas diversas profundidades em função
dos tratamentos com diferentes relações CaSO4/CaCO3
Profundidade |
relação CaSO4/CaCO3 |
|||||
0/0 |
100/0 |
75/25 |
50/50 |
25/75 |
0/100 |
|
cm |
Cálcio, mmolc dm-3 |
|||||
0-10 |
4,5b (1) |
9,5a |
9,6a |
11,0a |
12,0a |
13,0a |
10-20 |
5,5d |
11,0bc |
12,0bc |
13,0b |
15,0ab |
18,0a |
20-30 |
5,7b |
15,0a |
16,0a |
15,0a |
1,0b |
13,0a |
30-40 |
5,4b |
12,0a |
13,0a |
11,0a |
6,0b |
6,2b |
40-50 |
5,4a |
7,5a |
7,0a |
6,5a |
4,8a |
5,4a |
50-60 |
5,5a |
6,0a |
5,0a |
5,5a |
4,0a |
4,0a |
cm |
Magnésio, mmolc dm-3 |
|||||
0-10 |
5,1b |
5,9a |
4,9a |
4,0a |
3,8a |
5,1a |
10-20 |
5,9a |
4,1a |
6,1a |
3,9a |
3,7a |
5,0a |
20-30 |
3,8a |
4,1a |
4,0a |
4,0a |
4,3a |
3,9a |
30-40 |
2,0b |
4,0a |
5,0a |
4,0a |
2,0a |
2,0a |
40-50 |
1,0a |
2,0a |
1,1a |
1,5a |
1,0a |
1,0a |
50-60 |
1,1a |
1,1a |
1,1a |
1,5a |
1,0a |
1,0a |
cm |
Potássio, mmolc dm-3 |
|||||
0-10 |
100a |
69b |
70b |
67b |
72b |
59b |
10-20 |
79a |
51b |
60b |
69b |
42cb |
33d |
20-30 |
30a |
22a |
21ab |
20ab |
8c |
10bc |
30-40 |
31a |
21ab |
21ab |
10b |
15b |
11b |
40-50 |
30a |
20ab |
20ab |
29ab |
20ab |
15b |
50-60 |
29a |
19ab |
19ab |
19ab |
18ab |
12b |
cm |
Sulfato, mmolc dm-3 |
|||||
0-10 |
31c |
52b |
71a |
48b |
33c |
28c |
10-20 |
35c |
61b |
81a |
55b |
41c |
19d |
20-30 |
2d |
68a |
68a |
58a |
48b |
17c |
30-40 |
1d |
52a |
51a |
31b |
13c |
2d |
40-50 |
5a |
4a |
4a |
5a |
3a |
4a |
50-60 |
1a |
6a |
5a |
6a |
5a |
3a |
(1) Médias seguidas pela mesma letra, na linha diferem entre si (Tukey 5%). |
Para o N-NO3-,
ao contrário do amônio, observou-se acentuado acúmulo em profundidade (Quadro
3). Tal comportamento revela a possibilidade de perdas mais expressivas de nitrato
por lixiviação, quando da aplicação de gesso para o algodoeiro. Raij (1988)
verificou maior absorção de nitrato do subsolo pelo sorgo, quando da aplicação
de gesso, provavelmente pelo fato de o gesso ter promovido maior crescimento
radicular em profundidade. Ao que tudo indica o esgotamento diferencial em
nutrientes do subsolo ácido, em função da minimização da acidez promovida pelo
gesso, deve depender da tolerância das espécies vegetais à acidez do solo.
A diminuição da
relação CaSO4/CaCO3, promoveu sensível decréscimo no teor
de Al3+, nas camadas 0-10 e 10-20 cm (Quadro 3). A total
substituição do CaSO4 pelo CaCO3 acarretou a redução do
teor de Al3+ na ordem de 5,4 mmolc dm-3, para
a camada de 0-10 cm; de 5,6 mmolc dm-3, para a camada de
20-30 cm, e 1,3 mmolc dm-3 para a camada de 30-40 cm,
quando comparado com a testemunha. A redução em profundidade foi bem menos
expressiva, mesmo por que o teor natural de Al3+ no subsolo é
bastante baixo. É provável que a redução no teor de alumínio se deva ao
deslocamento de OH- por SO42- da superfície de
óxidos hidratados de ferro e alumínio com conseqüente neutralização parcial do
alumínio (Rajan, 1978).
Vale destacar que
reduções mais significativas no teor de Al3+, do que as observadas
no presente estudo com o uso de CaSO4.2H2O puro, foram
observadas por Guilherme (1986), com o uso do gesso agrícola. Nesse sentido,
segundo Oates & Caldwell (1985), o gesso agrícola contém flúor como
impureza, o qual complexa alumínio e favorece sua lixiviação para camadas mais
profundas do solo. Esse fato foi constatado por Farina & Channon (1988), ao
observarem lixiviação de Al3+ abaixo de 90 cm de profundidade.
Todavia, deve-se ressaltar que as reduções no teor de alumínio trocável
causadas pelo CaSO4.2H2O, que, a princípio, parecem pouco
significativas, são de grande importância, em conseqüência da baixa CTC efetiva
do solo em estudo (Quadro 1).
Observou-se maior
eficiência do CaCO3, quando comparado com CaSO4, em
reduzi r a acidez do solo, notadamente nas camadas superficiais (Quadro 3). Com
redução da relação CaSO4/CaCO3, houve uma tendência de
aumento no valor de pH do solo nas camadas de 0-10 e 10-20 cm (Quadro 3).
Todavia, em relação à testemunha, mesmo nas camadas superficiais, o CaSO4
apresentou apreciável capacidade de reduzir a acidez do solo (Quadro 3). Nesse
sentido é interessante observar que em profundidade, na camada de 30-40 cm,
houve um aumento no pH do solo com a elevação da relação CaSO4/ CaCO3.
O aumento do pH do solo com a utilização do CaSO4 puro ou de gesso
foi também observado por Raij (1988), sendo basicamente atribuído a uma reação
de troca de ligantes na superfície das partículas de solo, envolvendo óxidos
hidratados de ferro e alumínio com SO42- deslocando OH-
para a solução do solo e, assim, promovendo neutralização parcial da acidez.
Quadro 3. Teores
de amônio, nitrato, alumínio e pH nas diversas profundidades, em função dos
tratamentos com diferentes relações CaSO4/CaCO3
Profundidade |
relação CaSO4/CaCO3 |
|||||
0/0 |
100/0 |
75/25 |
50/50 |
25/75 |
0/100 |
|
cm |
N- amônio, mg dm-3 |
|||||
0-10 |
40a (1) |
41a |
42a |
42a |
42a |
48a |
10-20 |
49a |
39a |
43a |
40a |
51a |
41a |
20-30 |
53a |
45a |
48a |
48a |
40a |
48a |
30-40 |
60a |
43a |
49a |
49a |
50a |
50a |
40-50 |
82a |
53c |
55c |
61b |
60b |
67b |
50-60 |
78a |
63b |
50c |
59b |
63b |
68b |
cm |
N- nitrato, mg dm-3 |
|||||
0-10 |
9,1a |
4,9b |
4,8b |
3,8b |
5,0b |
3,9b |
10-20 |
9,7a |
6,2b |
6,5b |
4,2b |
4,8b |
3,8b |
20-30 |
8,7ab |
9,8a |
8,1b |
7,0b |
7,1b |
5,9b |
30-40 |
9,6a |
8,7ab |
8,2b |
8,1b |
7,9b |
7,9b |
40-50 |
9,0a |
9,7a |
9,8a |
7,1b |
7,5b |
7,5b |
50-60 |
6,5a |
7,3a |
6,4a |
4,5b |
5,5b |
4,3b |
cm |
Alumínio, mmolc dm-3 |
|||||
0-10 |
7,3a |
5,5b |
4,2c |
2,3d |
1,9d |
1,9d |
10-20 |
6,5a |
4,0b |
2,4c |
2,1c |
1,8c |
0,9d |
20-30 |
2,3a |
1,8a |
1,0b |
1,0b |
1,0b |
1,0b |
30-40 |
2,2a |
1,8a |
1,0b |
0,9b |
1,0b |
2,0a |
40-50 |
1,0ab |
1,0ab |
0,9b |
1,0ab |
1,7a |
1,5a |
50-60 |
1,2a |
1,2a |
0,9a |
0,9a |
0,9a |
1,0a |
cm |
pH |
|||||
0-10 |
4,6b |
5,1ab |
5,2ab |
5,4ab |
5,5a |
5,6a |
10-20 |
4,7d |
4,9cd |
5,1bc |
5,5d |
5,6b |
6,0b |
20-30 |
4,5b |
5,0a |
5,3a |
5,3a |
5,2a |
5,1a |
30-40 |
4,8b |
5,2a |
5,1ab |
5,1ab |
4,9ab |
4,9ab |
40-50 |
5,3a |
5,3a |
5,3a |
5,5a |
5,5a |
5,5a |
50-60 |
5,8a |
5,4b |
5,5ab |
5,5ab |
5,8a |
5,8a |
(1) Médias seguidas pela mesma letra, na linha diferem entre si (Tukey 5%). |
O quadro 4 apresenta
o efeito dos diferentes tratamentos sobre o crescimento do sistema radicular do
algodoeiro. No geral, observa-se acentuado aumento no crescimento de raízes com
o uso de CaSO4 e/ou CaCO3, quando se compara com a
testemunha. Todavia, até a profundidade de 30 cm, observa-se efeito menos
pronunciado da substituição do CaSO4 pelo CaCO3, sobre o
crescimento radicular. Baseado nisso, ressalta-se, ainda, que o comprimento
total de raízes aumentou em cerca de 20% com a total substituição do CaSO4
pelo CaCO3, como pode ser calculado pelos dados apresentados
no quadro 4.
Ao que tudo
indica, o efeito depressivo do CaSO4 sobre o crescimento das raízes,
principalmente nas profundidades de 0-10 e 10-20 cm, parece ter sido exercido pelo
maior acúmulo de enxofre nessas camadas (Quadro 2), ocasionando possíveis
distúrbios nutricionais ligados ao metabolismo do nitrogênio e fósforo. Farina
& Channon (1988) constataram redução na densidade de raízes de milho em
camadas de solo com o acúmulo de enxofre. Segundo esses autores, o efeito
depressivo do enxofre é devido a distúrbios nutricionais, mais provavelmente
ligados ao metabolismo do nitrato. No entanto, Vilela et al. (1995) obtiveram
resposta à produção de grãos de soja e de milho com a aplicação de doses
crescentes de enxofre na forma de gesso e flor de enxofre, até 432 kg ha-1
de enxofre.
Pelo
comportamento diferencial do CaSO4 em relação ao crescimento
radicular, aumentando-o em profundidade e reduzindo-o nas camadas superficiais,
destaca-se a necessidade de aprofundar o estudo do efeito do gesso sobre o
crescimento radicular, com especial atenção na definição de doses para
diferentes relações solo-planta. O menor crescimento radicular nas camadas de
0-10 e 10-20 cm, proporcionado pelas relação CaSO4/CaCO3 mais
elevadas, pode ser atribuído à menor quantidade efetiva de corretivo atuante na
modificação da acidez do solo.
Quadro 4.
Comprimento radicular nas diversas profundidades, em função dos tratamentos com
diferentes relações CaSO4/CaCO3 .
Profundidade |
Relações CaSO4/CaCO3 |
|||||
0/0 |
100/0 |
75/25 |
50/50 |
25/75 |
0/100 |
|
(cm) |
Comprimento do sistema radicular (cm) |
|||||
0-10 |
900 b (1) |
2802 a |
2910 a |
3102 a |
3300 a |
3202 a |
10-20 |
400 b |
1800 ab |
2001 b |
2801 a |
3201 a |
2951 a |
20-30 |
304 c |
2005 b |
2102 b |
1900 b |
2804 a |
3000 a |
30-40 |
200 b |
1902 a |
2003 a |
1811 a |
1952 a |
1901 a |
40-50 |
100 b |
1100 a |
1201 a |
901 a |
851 a |
954 a |
50-60 |
150c |
1000 a |
1101 a |
852 ab |
800 a |
900 a |
(1) Médias seguidas pela mesma letra, na linha, não diferem entre si .(Tukey, 5%). |
Quando comparado
com a testemunha, observa-se que o uso de apenas CaSO4 permitiu um aumento
de cerca de 25 vezes na produção de matéria seca da parte aérea (0,67 g de
matéria seca por planta na testemunha contra 17,36 g por planta com aplicação
de CaSO4) do algodoeiro (Quadro 5). Esse expressivo efeito do CaSO4,
ao que tudo indica, está ligado à minimização das condições adversas inerentes
à acidez do solo; ao aumento do teor de cálcio (Quadro 2); à redução do
alumínio tóxico e a elevação do pH (Quadro 3). Ainda, a melhoria das condições
químicas do solo promovida pela aplicação de apenas CaSO4 refletiu
em um aumento de 4,8 vezes no crescimento radicular (Quadro 4), com conseqüente
aumento na produção de matéria seca da parte aérea (Quadro 5). Conforme já
ressaltado, o algodoeiro é uma espécie vegetal das mais sensíveis à acidez do
solo, principalmente em relação à deficiência de cálcio e toxidez por alumínio.
Todavia, embora o
CaSO4 promova maior crescimento do algodoeiro em solos ácidos,
deve-se destacar que os dados do quadro 5 mostram que a produção de biomassa da
parte aérea do algodoeiro foi reduzida, mesmo com a substituição de apenas 25%
do CaCO3 à semelhança do observado para o crescimento radicular
(Quadro 4).
Tal efeito
depressivo do CaSO4, assim como observado para o crescimento do
sistema radicular parece estar ligado, além daqueles decorrentes da menor
quantidade de corretivo da acidez do solo, a distúrbios nutricionais causados,
possivelmente, pela absorção de quantidades excessivas de enxofre do solo,
notadamente distúrbios ligados à interação desse nutriente com a assimilação do
nitrogênio e de fósforo. Segundo Haddad (1983), determinadas espécies vegetais
apenas crescem satisfatoriamente se houver um balanço adequado de
disponibilidade de nitrogênio, fósforo e enxofre no solo. Portanto, apesar de o
algodoeiro ser considerado uma espécie muito exigente em enxofre (Gaines &
Phatak, 1982), deve-se atentar para os referidos distúrbios, quando da
definição de doses de gesso a serem usadas.
Quadro 5-
Produção de matéria seca da parte aérea e raiz e relação raiz/parte aérea, em
função dos tratamentos com diferentes relações CaSO4/CaCO3
.
Relações CaSO4/CaCO3 |
Parte aérea |
Raiz |
Relação raiz/parte aérea |
g/planta |
|||
0/0 |
0,76 d(1) |
0,55 c |
0,82 a |
0/100 |
33,24 a |
5,98 a |
0,18 b |
25/75 |
24,63 b |
3,94 b |
0,16 b |
50/50 |
24,61 b |
3,93 b |
0,16 b |
75/25 |
21,70 bc |
3,91 b |
0,18 b |
100/0 |
17,36 c |
2,95 b |
0,17 b |
(1) Médias seguidas pela mesma letra, na coluna, não diferem entre si. (Tukey, 5%) |
CONCLUSÕES
1. Com o aumento
da relação CaSO4/CaCO3 houve acentuada movimentação de
cálcio e sulfato em profundidade.
2. Não se
observou efeito da relação CaSOJCaCO3 sobre a movimentação em
profundidade de amônio e potássio. Todavia, do ponto de vista agronômico a movimentação
de magnésio foi bastante expressiva.
3. A adição de
apenas CaSO4 aumentou a produção de matéria seca e o crescimento das
raízes de algodoeiro em profundidade, atestando o potencial do uso do gesso
agrícola, principalmente em espécies mais sensíveis à acidez.
(1)-
Trabalho financiado pelo CNPq. Recebido para publicação em dezembro de 1996 e
aprovado em junho de 1998.
(2)-
Engenheiro Agrônomo, Departamento de Ciência do Solo, Universidade Federal de
Lavras - UFLA - CEP 37200-000 Lavras (MG).
(3)-
Professor Titular do Departamento de Ciência do Solo, UFLA.
(4)-
Professor Substituto do Departamento de Ciência do Solo, UFLA.
(5)-
Professor Adjunto do Departamento de Ciência do Solo, UFLA.
(6)-
Professor Titular dn Departamento de Ciências Exatas, UFLA.
Publicado
originalmente na Revista Brasileira de Ciência do Solo, 22:451-457, 1998-
Campinas/SP.
LITERATURA CITADA
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